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Súmula Vinculante
Súmula Vinculante

  1.   Introdução

 

 

A partir da Emenda Constitucional nº 45, de 8 de dezembro de 2004, o Brasil passou a prever a possibilidade de adoção de chamada súmula vinculante, desde que por decisão de dois terços dos membros do Supremo Tribunal Federal, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional. Obedecidos tais requisitos e com a publicação na imprensa oficial, a súmula deverá ter efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta.

 

É fácil perceber que, com a nova regulamentação, algumas decisões do Poder Judiciário, diga-se do Supremo Tribunal Federal, ganham uma importância nunca antes vista. Está havendo indiscutivelmente uma supervalorização deste Poder, o que pode ocasionar a desconsideração da tripartição das funções do Estado, pela simples concessão de força legislativa a algumas decisões judiciais. Não é por outro motivo que o assunto foi e continua sendo amplamente discutido entre os estudiosos do Direito Pátrio. A matéria é tão polêmica que divide as opiniões dos juristas.

 

Este trabalho visa detalhar os pontos da novel lei, analisando sua adequação no ordenamento brasileiro, com o propósito de abrir mais um campo para reflexões sobre a súmula vinculante e a reforma por qual o ordenamento jurídico tem passado.  qual o ordenamento jurídico tem passado.

 

  

  1. 2.                 Origem

 

A Súmula já existia no SupremoTribunal Federal desde 1963. Naquele ano, aprovou-se, no dia 28 de agosto, uma emenda ao Regimento Interno da Corte, que a criava. A Súmula do Supremo Tribunal ou, simplesmente, Súmula, foi organizada pela Comissão de Jurisprudência e aprovada na sessão plenária de 13 de dezembro daquele ano para vigorar a partir do reinício dos trabalhos do tribunal, em março de 1964.

Na explicação preliminar da primeira publicação (janeiro de 1964) da Súmula (os acréscimos seriam divulgados pelo Diário da Justiça, em três publicações consecutivas, procedendo-se do mesmo modo quanto às alterações e cancelamentos), subscrita pela Comissão de Jurisprudência integrada pelos Ministros Gonçalves de Oliveira, Pedro Chaves e Victor Nunes Leal (seu relator e, provavelmente, o idealizador da novidade), é possível encontrar alguns esclarecimentos importantes.

E, agora, tem-se discutido a proposta de estender a idéia da vinculação, vale dizer a obrigatoriedade da tese das decisões de algumas matérias, aos graus inferiores de jurisdição, a critério dos tribunais superiores, o Supremo Tribunal e o Superior Tribunal de Justiça. Não é, certamente, uma capitulação ao Common Law, porém indício de sua influência consubstanciada em uma caricatura.

De uma certa forma, o problema resulta de uma tensão, que teve início com a República. Adotamos, então, lapidada pela inefável pena de Rui Barbosa, uma Constituição que, embora com desvios e distorções formais, adotava o modelo dos Estados Unidos da América. Rui, cultor do direito público inglês, assumira também o direito americano.

  

  1. 3.                 Natureza Jurídica

 

A origem palavra Jurisprudência deriva do latim juris-prudentia, que significa prudência do direito, tomada a expressão prudência como virtude intelectual voltada para a prática, para a ação honesta, leal e justa.

 

Ensina-nos Miguel Reale (1995, p. 167) que, no Brasil, o conceito de jurisprudência quer significar a "prática dos tribunais", quando caracterizada por certa continuidade, isto é, "forma de revelação do direito que se processa através do exercício da jurisdição, em virtude de uma sucessão harmônica de decisões dos tribunais".

 

Roberto Rosas considera a jurisprudência como "um código norteador das decisões a seguir (...) a reiteração de casos análogos passados para o rol dos fatos consumados, que somente podem ser revistos em virtude de motivos relevantes ou alteração das suas origens ou fonte emanadora: a lei, a doutrina, etc". Importa, notar desde já que, em determinadas situações, o confronto entre Jurisprudências dos Tribunais ou entre a Jurisprudência e os Órgãos da Administração Pública, pode provocar, preenchidos os requisitos legais, pedido de edição de súmula com efeito vinculante e erga omnes, instituto que será analisado nos próximos capítulos.

 

Assim, pode-se afirmar que a súmula vinculante é fonte de direito, situada no mesmo nível hierárquico que a lei. Equivale dizer, que, diante dos efeitos vinculantes e erga omnes, em sendo declarada inconstitucional uma lei pela súmula vinculante, passaram a vigorar os dispositivos desta, imediatamente após a sua publicação. De outro modo, se uma súmula vinculante for contrariada por lei que lhe é posterior, as disposições daquela deixarão de prevalecer, passando a vigorar os termos da lei nova, pelo menos até que nova súmula seja editada tratando da matéria.

 

Fica clara a grande inovação da Súmula Vinculante em nosso ordenamento casuística constituem criações engenhosas do homem, os sistemas jurídicos nacionais, concebidos para salvaguarda e aperfeiçoamento da sociedade humana”.

 

Jurídico, eis que ela confere nova roupagem ao sistema brasileiro5, que passa a ter maiores semelhanças com o sistema anglo-saxão, já que os operadores do direito terão de dar mais valor às casuísticas dos Tribunais, em razão dessa nova fonte do direito.

 

 

Até se poderia pensar, num primeiro momento, que é inconstitucional a idéia de se inserir em nosso ordenamento uma súmula com efeito vinculante e erga omnes, eis que ela ofenderia cláusula pétrea da Constituição Federal de 1988, prevista no art. 5º, inciso II, segundo a qual: “Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Porém, nos parecer que este dispositivo não traz a exigência de lei em seu sentido formal, mas sim genericamente considerada. E ainda que assim não o fosse, havendo autorização expressa na Constituição, introduzida pela Emenda Constitucional nº 45/2004 e em lei formal, nada impede a imposição de obrigações, diante da delegação prévia do Poder Legislativo, à semelhança do que ocorre com as leis delegadas, medidas provisórias e atos administrativos que emanam normas gerais.

Ficamos, pois, com Francesco Carnelutti (1999, p. 150) quando assevera que: “o processo jurisdicional pode servir também para a formação de comandos novos, gerais ou particulares. Nesta acepção, o processo jurisdicional chama-se processo dispositivo.

 

A jurisdição é, portanto, uma fonte jurídica, ao lado da legislação”. Entendemos que a súmula vinculante tem natureza jurídica de fonte do direito, por ser uma jurisprudência sistemática, pois na lição de Norberto Bobbio (1991, p. 194):

 

“É freqüente entre os juristas a opinião de que a ciência jurídica moderna nasceu em compasso com a jurisprudência exegética a da jurisprudência sistemática, ou, em outras palavras, quando a jurisprudência se elevou ao status de ciência, tornando-se sistemática”.

 

Para se chegar à jurisprudência sistemática, é necessário desenvolver analiticamente, mediante regras pré-estabelecidas, alguns postulados iniciais, provenientes de julgamentos de casos concretos, com base em semelhanças, para então formar conceitos cada vez mais gerais, para chegar a conceitos generalíssimos que permitam unificar a interpretação quanto a determinado tema (BOBBIO, 1991, p. 194). Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery (2006, p. 300) conceituam súmula como sendo “o conjunto das teses jurídicas reveladoras da jurisprudência reiterada e predominante no tribunal e vem traduzida em forma de verbetes sintéticos numerados e editados. O objetivo da súmula é fixar teses jurídicas in abstracto que devem ser seguidas pelos membros do tribunal, de modo a facilitar o exercício da atividade jurisdicional”.

 

Os mesmos doutrinadores comentam que “o ordenamento permite que coexistam duas súmulas no STF: a) vinculante; e b) não-vinculante ou simples” (NERY JUNIOR, NERY, 2006, p. 300), conforme se atenda ou não os requisitos impostos pela Constituição Federal.

 

Mas o que seria esse efeito vinculante da súmula ora analisada?

 

Gilmar Ferreira Mendes (2000) esclarece que “a eficácia erga omnes e o efeito vinculante deveriam ser tratados como institutos afins, mas distintos”. Para ele “o conceito de efeito vinculante em relação aos órgãos e agentes públicos é instituto jurídico desenvolvido no Direito processual alemão, que tem por objetivo outorgar maior eficácia às decisões proferidas por aquela Corte Constitucional, assegurando força vinculante não apenas à parte dispositiva da decisão, mas também aos chamados fundamentos ou motivos determinantes (tragende Gründe). A declaração de nulidade de uma lei não obsta à sua reedição, ou seja, a repetição de seu conteúdo em outro diploma legal. Tanto a coisa julgada quanto a força de lei (eficácia erga omnes) não lograriam evitar esse fato. Todavia, o efeito vinculante, que deflui dos fundamentos determinantes (tragende Gründe) da decisão, obriga o legislador a observar estritamente a interpretação que o tribunal conferiu à Constituição. Conseqüência semelhante se tem quanto às chamadas normas paralelas. Se o tribunal declarar a inconstitucionalidade de uma Lei do Estado A, o efeito vinculante terá o condão de impedir a aplicação de norma de conteúdo semelhante do Estado B ou C (Cf. Christian Pestalozza, comentário ao § 31, I, da Lei do Tribunal Constitucional Alemão (Bundesverfassungsgerichtsgesetzin: Direito Processual Constitucional (Verfassungsprozessrecht), 2a edição, Verlag C.H. Beck, Munique, 1982, pp. 170/171, que explica o efeito vinculante, suas conseqüências e a diferença entre ele e a eficácia seja inter partes ou erga omnes)”.

 

Concordamos com esse posicionamento, pois veremos adiante que, quando se trata da chamada Súmula Vinculante, objeto do presente estudo, a obediência aos seus comandos hão de ser seguidos por todos os órgãos do Poder Judiciário e da

 

Administração Pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal. Porém, resta indagar se a súmula vinculante realmente tem o condão de impedir o Legislativo de editar lei nova que contrarie o fundamento daquela súmula, pois como vimos na lição de Gilmar Mendes o efeito vinculante obriga o legislador a observar estritamente a interpretação que o Tribunal conferiu à Constituição. Em um primeiro momento, poderia parecer que contrarie o Estado Democrático de Direito e o Princípio da Separação-Divisão dos Poderes por impedir o Legislativo de desenvolver a sua função precípua. Entretanto, com os novos contornos doutrinários do Tribunal Constitucional e da nova teoria da divisão dos Poderes, tendemos a afirmar que, sim, o efeito vinculante obriga o legislador a observar estritamente a interpretação que o Tribunal conferiu à Constituição. Vejamos o porquê: Cappelletti (1999, p. 47) aponta a necessidade de um judiciário distinto do tradicional, ressaltando que “(...) a dura realidade da história moderna logo demonstro que os Tribunais - tanto que confrontados pelas duas formas acima mencionadas de gigantismo estatal, o legislativo e o administrativo - não podem fugir de uma inflexível alternativa. Eles devem de fato escolher uma das duas possibilidades seguintes: a) permanecer fiéis, com pertinácia, à concepção tradicional, tipicamente do século XIX, dos limites da função jurisdicional, ou b) elevar-se ao nível dos outros poderes, tornarse enfim o terceiro gigante, capaz de controlar o legislador mastodonte e o leviatanesco administrador”.

 

Américo Bedê Freire Júnior (2006) assevera que, hodiernamente, há uma grande preocupação tanto jurídica, quanto política, de se criar um novo perfil para a atuação do Poder Judiciário, permitindo a efetivação dos direitos fundamentais. Para ele “É certo que uma postura mais ativa do Judiciário implica em possíveis zonas de tensões com as demais funções do Poder, todavia não se defende uma supremacia de qualquer das funções, mas sim a supremacia da Constituição, que implica que o Judiciário não é um mero carimbador de decisões políticas das demais funções. É preciso, portanto, conciliar o texto constitucional com uma prática constitucional adequada, e tal missão somente pode ser cumprida se o Poder Judiciário não pensar mais no dogma do princípio liberal da legalidade, mas sim no princípio da Constitucionalidade dos atos”.

 

Ainda na lição de Américo Bedê Freire Júnior (2006), “o legislador não é o único responsável por viabilizar a Constituição, o Juiz tem a missão constitucional de impedir ações ou omissões contrárias ao texto, sem que com essa atitude esteja violando a Constituição. O Juiz não é a mais a simples boca da lei, mas sim intérprete constitucional qualificado que vai permitir que a Constituição não soçobre numa realidade instável como a que vivemos. Tal postura é ínsita à nova leitura da separação de poderes, adequada a nosso tempo de globalização e falta de paradigmas. Não podemos pensar a separação de poderes com os fundamentos de uma sociedade que não

mais existe; ao contrário, devemos construir um princípio que possa ter aplicação em nossos dias. Para o cumprimento desse mister é indispensável vislumbrar no princípio da separação de funções não um fim em si mesmo, mas um meio para a efetivação da Constituição, devendo o Judiciário, portanto, nesse novo momento, atuar diretamente na preservação da supremacia da Constituição”. Segundo o jurista Fernando Paulo Suordem (1995, p. 62): “na sua dimensão orgânico-funcional, o princípio da separação dos poderes deve continuar a ser encarado como princípio da moderação, racionalização e limitação do poder político estatal, no interesse da liberdade. Tal constitui seguramente o seu núcleo imutável”.

 

Percebe-se, portanto, que, sob a nova ótica do princípio da divisão das funções estatais, o Judiciário merece as atribuições que lhe serão outorgadas pela Constituição para instituir súmulas de efeito vinculante, justamente para defender os preceitos da própria Constituição.

 

Cumpre esclarecer, ainda, que o efeito vinculante da súmula brasileira diverge do efeito vinculante do direito alemão porque o primeiro abrange matéria de mérito e processual, enquanto que o segundo apenas matéria de mérito.

 

É o que ensina Gilmar Ferreira Mendes (2000): “De imediato, impende ressaltar que a doutrina constitucional somente reconhece efeito vinculante às decisões de mérito (Sachentscheidungen) proferidas pelo Bundesverfassungsgericht. O efeito vinculante não imanta julgados de caráter exclusivamente processual, não abrangendo, por isso, decisões de simples caráter interlocutório”.

 

Entendemos que, diversamente do Direito alemão, nada obsta que a súmula vinculante brasileira estabeleça norma processual, por exemplo, determinando que no cumprimento de sentença o devedor deverá ser intimado pessoalmente para pagamento. Constata-se, pois, que em razão do efeito vinculante, tanto os princípios extraídos da parte dispositiva da Súmula, quanto os fundamentos determinantes da decisão, vinculam todos os tribunais e autoridades administrativas nos casos futuros, razão pela qual ela não pode ser aplicada indevidamente, ou seja, é inadmissível interpretação diversa daquela proferida nos votos vencedores dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, salvo na hipótese de revisão ou cancelamento por esta Corte Constitucional.

 

Assim, pelo que podemos extrair do objeto da súmula vinculante, a par do entendimento, não resta muita dúvida acerca da sua natureza jurídica como ato tipicamente jurisdicional com força vinculante. A súmula terá por objeto sempre uma declaração acerca da validade, da interpretação ou da eficácia de normas determinadas.

 

 

  1. 4.                 Formato e Tipologia da Súmula Vinculante

 

A súmula vinculante requer enunciado curto, direto e claro. O enunciado não deve conter mais de uma tese e contemplar distintas instituições jurídicas. Não deve ser exaustivo ao ponto de dispor sobre uma conduta e abrirem-se inúmeras exceções.

 

Não pode resolver sobre fatos que dependam de dilação probatória. O Ministro Victor Nunes Leal dizia que, quando o enunciado da súmula não é claro, quando requeira interpretação de interpretação, tem de ser cancelado, porque descumpre sua finalidade.

 

A aprovação da súmula vinculante efetiva-se por decisão de dois terços dos membros do Supremo Tribunal Federal (8 dos 11 Ministros). Já se disse que basta um voto vencido de ministro do STF para que se tenha como não amadurecida a tese, nem pacificada a doutrina do tribunal. Não é raro que o voto vencido de um ministro, hoje, se torne a jurisprudência do tribunal no futuro próximo.

 

É natural que o tribunal tenha de funcionar por maioria de votos, para evitar impasses. Afinal, a maioria é a tônica dominante do regime democrático. Os tribunais, como o Judiciário, são instituições democráticas. Porém, para a excepcional função de estabelecer a forma de decidir de todos os juízes e tribunais, a responsabilidade é tão grave que não se deveria decidir por maioria. Como faz a Suprema Corte dos Estados Unidos, para assuntos fundamentais, os ministros trocam memorandos entre si até que seja obtido o consenso.

 

Ainda que o art. 103-A da Constituição permita a súmula vinculante pela aprovação de dois terços dos ministros, devia ser sobrestada até a obtenção da unanimidade. O Tribunal prestará um favor à nação ante a necessidade de que seja isonômico o tratamento que se sabe aplicável a todos os litígios. Embora a maioria seja suficiente para a definição democrática, no caso da súmula vinculante, tão forte e definitivo é seu papel que os ministros deviam aguardar a melhor oportunidade do consenso que costuma suceder à capacidade de troca de memorandos que não deve sofrer limite de esforços e de persistência.

 

  1. 5.                 Pressuposto da súmula vinculante

 

Deve ocorrer controvérsia atual, presente, não superada, entre órgãos judiciários ou entre esses e a Administração Pública que acarrete grave insegurança jurídica e a relevante multiplicação de processos sobre questões idênticas.

 

A insegurança jurídica existe porque os juízes não se entendem. Decidem de forma contraditória e conflituosa, causando desgaste à autoridade da Justiça. As pessoas ficam sem o direito de planejar o futuro porque as decisões judiciais se tornam imprevisíveis. A súmula vinculante destina-se a dar segurança ao povo com jurisdição previsível.

 

 

  

  1. Objeto da súmula vinculante e sua finalidade

 

O objeto da súmula é a validade, a interpretação e a eficácia da norma. A validade diz respeito à adequação da norma à Constituição. A interpretação é a obtenção do sentido correto para as palavras da lei. A eficácia é a consecução, pela lei, dos objetivos que foram anunciados na apresentação do projeto e na elaboração legislativa.

 

Com a súmula vinculante, o Brasil produz o reverso do stare decisis dos Estados Unidos, que não avança em matéria constitucional, porque, dada a natureza rígida da Constituição, acarreta a petrificação da súmula. Somente a emenda constitucional poderia desfazer a grande lei em que se tornaria a súmula. A Constituição brasileira escolhe exatamente a matéria constitucional para nela construir a súmula vinculante. Dessa forma, a súmula brasileira engessa o repertório legislativo, estendendo a ordem constitucional ao campo da súmula.

 

A súmula vinculante destina-se à reconciliação dos juízes e à pacificação da jurisprudência. Da mesma forma que o governo pode estabelecer instruções normativas para aplicar as leis, o STF produz súmulas, sem o objetivo de fazer lei interpretativa, mas com o propósito de traçar o modo com que as leis serão executadas nos casos contenciosos. A separação de Poderes ocorre no contexto constitucional que dispõe sobre o livre exercício de cada um. Os tribunais não exercerão a devida jurisdição caso não possam processar e julgar as pessoas públicas que são as responsáveis pela maior parte de seu movimento.

 

 

  1. Dos requisitos para a edição, revisão ou cancelamento de súmula vinculante

 

O instituto da súmula vinculante foi introduzido no direito pátrio consubstanciado em três princípios de direito, a saber, a segurança jurídica, a isonomia e a celeridade processual, além de salvaguardar e resgatar a credibilidade do Poder Judiciário perante a sociedade.

 

Nos termos do art. 2º, §1º, da lei regulamentadora da súmula vinculante, mister se faz a demonstração perante o plenário do Pretório Excelso de que a matéria é objeto de controvérsia entre os diversos órgãos do Poder Judiciário ou, ainda, entre estes e a Administração Pública, cuja divergência tem efeito danoso, potencial ou efetivo, para a segurança jurídica, devendo, ainda, traduzir-se em fator relevante de multiplicação de querelas judiciais que versem sobre o mesmo objeto.

  

  1. Alcance da Súmula

 

A norma constitucional estabelece determinados requisitos que, se atendidos, conferirão á súmula o efeito vinculante descrito. Qual o alcance desses efeitos?

O efeito mais óbvio é a impossibilidade jurídica e a conseqüência invalidade de uma decisão judicial que contrariar a súmula vinculante.

Mas o aspecto mais importante da Reforma do Judiciário é, certamente, a aprovação da súmula vinculante para a Administração Pública. A partir de agora, está a Administração Pública direta e indireta, dos três níveis de governo, vinculadas ás súmulas do STF que gozarem do atributo da vinculação, isto é, que atenderem aos requisitos do art. 103-A da Constituição Federal, incluído pela Emenda Constitucional nº 45/2004 ou do art. 8º dessa mesma Emenda.

Se o STF, órgão supremo do Judiciário nacional, constitucionalmente competente para interpretar a Constituição Federal, decide que a interpretação de um dispositivo constitucional é em um determinado sentido, não é nem um pouco razoável que qualquer outro órgão do Estado brasileiro (seja judicial ou administrativo) venha dar outra interpretação ou venha decidir em sentido contrário. Isso significa que se o STF disser que o percentual correto de reajuste para um aposentado ou para o FGTS é xis, não pode (ou, pelo menos, não poderia) um juiz dar outro percentual ou o administrador público deixar de pagar esse xis de reajuste. Na prática, porém, nada disso vinha acontecendo: conforme o caso, alguns juízes continuavam a dar outros percentuais e os administradores públicos continuavam sem pagar o percentual devido (percentual devido, por óbvio, é o percentual conferido pelo STF). Contra atos (comissivos ou omissivos) que não conferem o percentual devido são propostas milhares (ou milhões) de ações judiciais; contra decisões que conferem percentual diferente do juridicamente devido, são propostos milhares (ou milhões) de recursos.

Parece estranho - e é totalmente ilógico - que possa o Estado descumprir uma ordem do próprio Estado. Essa situação esdrúxula parece agora que terminará.

A partir de agora - ao menos de acordo com o art. 103-A da Constituição Federal -, os juízes e demais agentes públicos não podem mais violar as decisões do próprio Estado brasileiro que se revestirem do atributo da vinculação, isto é, não podem violar as súmulas vinculantes previstas no mencionado dispositivo constitucional.

A jurisprudência não se tornará "rígida" ou "imutável", pois o STF poderá criar, rever e cancelar as súmulas, mediante provocação dos legitimados a propor ação direta de inconstitucionalidade (art. 103-A, § 2º, da Constituição Federal). A edição de súmulas, como, aliás, a prolação de qualquer julgamento, é algo que deve ser feito com a devida responsabilidade, não sendo razoável aceitar que, em um dia, uma questão seja julgada de um modo, no dia seguinte de outro e na semana que vem da mesma maneira que da primeira, de forma aleatória, dependendo que quem seja o julgador. Às vezes há julgamentos díspares efetuados pelo mesmo órgão!

é interessante notar que a vinculação da Administração Pública á súmula prevista no art. 103-A da Constituição Federal é algo que prescinde da utilização da ação judicial. Quando se diz que a súmula vincula a Administração Pública, não significa que apenas o procurador ou advogado da entidade estatal está proibido de ajuizar ação ou recorrer quando houver súmula vinculante. Muito ao revés: significa que todos os agentes públicos têm o dever de decidir, têm o dever de agir em conformidade com o disposto na súmula vinculante. Em outras palavras, quando o STF decidir, em uma ação declaratória de constitucionalidade, em uma ação direta de inconstitucionalidade, ou editar uma súmula vinculante, deve o administrador público determinar o cumprimento do conteúdo dessa decisão ou dessa súmula para todas as pessoas que estiverem em idêntica situação (ex. correção de FGTS), ainda que não tenham proposto qualquer ação judicial ou efetuado qualquer pedido administrativo.

Na verdade, a Emenda Constitucional nº 45 mitigou os limites subjetivos da coisa julgada (!), de modo que passam todas as pessoas que estiverem em uma determinada situação a terem o direito de efetivar (isto é, concretizar, realizar na prática) um determinado direito abstratamente conferido pela súmula ou pela ação abstrata, independentemente de obtenção para si de uma decisão judicial em um processo de conhecimento.

 

 

Conclusão

 

A adoção da súmula vinculante no direito brasileiro precisa ser bem mais amadurecida. Ela deve passar por um amplo debate junto a toda a comunidade do pensamento jurídico brasileiro, pelos órgãos representativos de classes tais como a Ordem dos Advogados do Brasil - OAB, a Associação dos Magistrados Brasileiros - AMB, dentre outras, sem o qual a sua adoção estaria fatalmente fadada ao fracasso, com o cometimento de injustiças às partes e o enfraquecimento substancial da justiça de primeiro grau.

 

É fato que as súmulas, da forma como foram sempre utilizadas no direito pátrio, prestam importantes serviços ao Poder Judiciário. Elas sempre constituíram indicativos úteis para os magistrados que, comumente, delas se utilizam nos deslindes que lhe são submetidos, sendo, na prática, já quase vinculantes, pela tendência natural dos magistrados em acompanhar os posicionamentos dos Tribunais Superiores. Sempre foram raros os casos de rebeldia às súmulas, o que demonstra o bom funcionamento do sistema até então.

 

Entretanto, sabemos também que clara e aberrante é a insegurança social que deriva da demora da prestação jurisdicional e a adoção da súmula vinculante, desde que bem estudada e debatida, poderia muito bem vir a desafogar o judiciário das demandas repetitivas, contribuindo, dessa maneira, de modo eficaz para atenuar graves carências e acarretar maior segurança, certeza e celeridade a um das divisões estatais que, de agora em diante estará a desempenhar decisiva participação nos destinos da humanidade.

 

 

 Referências

 

Ronaldo Rebello de Britto Poletti – Súmula Vinculante, ABA Associação Brasileira de Advogados, Brasília, 24 de novembro de 2008 http://www.aba.adv.br/index.php?action=verartigos&idartigo=34

 

Alessandro Samartin de Gouveia, Revista Jus Vigilantibus,

http://jusvi.com/artigos/25346/2

 

Arthur Mendes LoboMestrando em Direito pela UNAERPEspecialista em Direito; Ambiental pela UFG/RJEx-Professor Substituto da PUC/MG Advogado - BREVES COMENTÁRIOS SOBRE A REGULAMENTAÇÃO DA SÚMULA VINCULANTE

 

 

Leonardo Vizeu Figueiredo, Procurador FederalSÚMULA VINCULANTE E A LEI Nº 11.417, DE 2006: APONTAMENTOS PARA COMPREENSÃO DO TEMA.

 

Karla Virgínia Bezerra CaribeProcuradora Federal em Brasília, A SÚMULA VINCULANTE NO DIREITO BRASILEIRO: UMA INCOERÊNCIA DO SISTEMA JURÍDICO

José Tarcízio de Almeida Melo, Súmula vinculante: aspectos polêmicos, riscos e viabilidade.

AGUIAR, Marcelo Dias. A adoção da súmula vinculante no Brasil. Disponível em: . Acesso em: 25 set. 2007.

 

Bruno Mattos e Silva, Procurador Federal, Bacharel em Direito pela USP, A súmula vinculante. http://br.monografias.com/trabalhos912/a-sumula-vinculante/a-sumula-vinculante.shtml

 



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Ivonildo F. M. Junior


 




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